terça-feira, 1 de dezembro de 2009

De óculos como sem guarda-chuva

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Só óculos desaparecidos podem ver
o reino dos guarda-chuvas perdidos
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Eu pensava que só acontecia com guarda-chuvas, isso de todo mundo perder muitos e nunca ninguém achar algum. (Uma vez julguei ter achado um, num acesso de sorte, como eu me disse em tom triunfal – porque o céu, negro, já rugia uma tempestade daquelas. Mal desabou o toró eu abri, todo besta, meu belo guarda-chuva verde claro estampado com florzinhas vermelhas e amarelas. Me livrei da chuva, mas peguei uma ducha fortíssima, que o diabo do suposto guarda-chuva tinha um baita rombo na umbela.)

Pois acontece com óculos, também, esse lance de perdermos um monte deles e nunca acharmos um único par, pelo menos que nos sirva. (E o que é mais grave e misterioso: eles somem, principalmente, dentro de casa!) Vim a saber disso quando perdi meu primeiro exemplar da espécie, comprado poucas semanas antes, assim que meus olhos preguiçosos se recusaram a ler uma bula de colírio. De lá para cá já comprei dezenas e dezenas de óculos, que vou perdendo e reencontrando, perdendo e reencontrando... até que eles se cansam da brincadeira e somem para sempre. E não há meio de encontrá-los, pode acreditar. Nem contratando um detetive particular competente – ressalvando, não vou mentir, que isso eu só fiz três vezes.

Felizmente, no meu caso, esses desaparecimentos misteriosos só ocorrem com óculos de leitura, jamais com meu primeiro e único par de óculos para distância. Meu segredo: deixo-o sempre no mesmo lugar, amarrado com barbante ao pé da cama. Agora, por exemplo, acabei de procurar, em vão, todos os meus sete pares de óculos de leitura. Fazer o quê? Fechar o último livro do Paulo Coelho cujo nome esqueci agora, mas é aquele que fala sobre... sobre o que mesmo?... Bem, fechar o último livro do Saulo Joelho e sair para dar uma volta, ver se encontro um camelô de óculos. Se o encontrar, arranco-lhe da cara o precioso objeto e volto a jato para casa. Pouco importa se não me servirem. Faço qualquer sacrifício, uso até óculos para miopia, mal do qual não sofro (ainda!), para continuar lendo o Fauno Pentelho.

Antes de sair, lembro de pegar meus óculos para distância. Não encontro nenhuma das minhas quatro tesouras, mas corto o barbante com o isqueiro e ponho os óculos no bolso da camisa. Assim que saio do prédio, começa um chuva forte que nem rugir rugira. Como não tenho guarda-chuva há mais de 20 anos, vou em frente, correndo até a marquise do ponto de ônibus. Nem bem cheguei ao abrigo, já surge um buzum lá na curva. Ponho meus óculos para distância, que letreiro de ônibus eu só consigo ler a olho nu quando já não dá mais tempo de o motorista parar. Só então descubro que os óculos que libertei da escravidão ao pé da cama são... os de praia.
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12 comentários:

Anônimo disse...

Essa fotógrafa, Rachel Braga, é de Cachoeiro? Se for, deve ser minha parente.

Prof. Edson Rocha Braga

Tuca Zamagna disse...

Primeiro, professor: embora fotografe muito bem, Rachel Braga não é fotógrafa, mas artista plástica e designer.

Segundo, ela foi de Cachoeiro; hoje é mineira naturalizada, por vontade própria - a minha, que a registrei novamente na cidade onde nasci, Leopoldina, até então desprovida de sequer um Braga , enquanto vocês cachoeirenses os têm desbragadamente.

Por fim, sim, ela é sua parente, porque vem a ser irmã de Marília, sua irmã.

Anônimo disse...

Velhice nem é comprar óculos porque não consegue ler bula de colírio. Velhice mesmo é ler bula de colírio.
De quem é a ilustração dessa bonequinha com esse sorriso lindo? Ou seria foto? Você não sabe que a lei manda colocar crédito?!?!? Cadê?!?!?

Anita

Tuca Zamagna disse...

Colírio, Anita, não é só aquela agüinha fuleira que a gente pinga nos olhos quando eles estão meio ressecados ou pra não dar bandeira que fumou unzinho. Tem colírio barra pesada, antibiótico etc.

Velhice mesmo é reclamar da ausência do que está presente (Foto: Rachel Braga). Clique na foto pra ver o crédito em tamanho legível até para ceguetas que nem eu, pois tá em corpo 27!

E o que parece uma bonequinha, é na verdade... bem, amplie a foto que você vai perceber. Se na primeira ampliação ainda não der pra sacar, clique de novo pra ver a foto no tamanho original.

Karrão disse...

Essa foto do óculos tá do cacete, parece até aquele que eu perdi no táxi, duas vezes seguidas (e com o mesmo motorista). Quanto ao final dessa historinha, você deveria ter pego o guarda-chuva de florzinhas vermelhas e amarelas - que estava lá no início -, pra levar um certeiro empurrãozinho barranco abaixo.

Tuca Zamagna disse...

Quando você disse que eu deveria ter pego o guarda chuva...fiquei logo um tanto sobressaltado. Mas pra descer barranco, tudo bem. Posso até abrir o guarda-chuva e despinguelar dançando frevo.

Anônimo disse...

Eu não preciso aumentar letra!!! Eu enxergo muito bem!!!!
Se o colírio é barra pesada, você deveria ter consultado um médico!!!!
Você não sabe que não devemos usar medicamentos sem receita? E que o médico tem que explicar o que está te receitando??!?!?!
Anita

Jorge Eduardo disse...

Uma vez, eu levei um trabalho para um cliente. Ele passou a mão no telefone interno e disse: "Meus óculos". Dali a pouco, entra um empregado fardado de empregado, com os óculos numa bandeja de prata.Nem lembro se o cliente agradeceu...mas aqui em casa é sempre a mesma conspiração da minha dúzia. Vivem se escondendo. Posso pedir "meus óculos" que nenhum empregado fardado aparece.

Rindo de nervoso... ainda disse...

Faz-me refletir. Eu que venho operando seguidamente meus olhos, e perdendo óculos e óculos, não só porque eles se escondem, mas também porque flutuam meus graus ao sabor dos bisturis e das promessas de clarividência. Misteriosamente, nesses cuidados insanos com os olhos, só parei de perder meus óculos depois que me dediquei a cuidar das hemorróidas, com carinhos próprios da velhice, sem os temores do vício, e afastado de bisturis e demais objetos ponteagudos. No entanto, não sendo a medicina ciência exata, e nem merecendo a memória o que pensa de si, tenho por aqui três pares espalhados.

Tuca Zamagna disse...

Paulinho, se você enxerga muito bem, porque reclamou da ausência de crédito na foto da Rachel Braga?
Anita, faça como eu: perca de vez em quando os óculos na portaria do prédio. Depois é só interfonar e pedir para o porteiro, devidamente fardado, entregá-lo pelo elevador.
Jorge, se o seu problema atual é no terceiro olho, cuidado para não perder nele cenouras e outros legumes traiçoeiros.

Eliane F.C.Lima disse...

Ah, Tuca, não se importe se você não tinha ido ao meu Literatura em vida 2. Eu, como "mulher de malandro", venho aqui mesmo assim, e rio muito. Preciso disso. Acabei de me fartar de rir com esse texto. Para me compensar, quero que você escreva mais e mais.
Abração,
Eliane

Anga Mazle disse...

Ele vai, Eliane, e toda hora. Difícil é parar aqui. Aí a equipe é que tem de se virar. Eu, principalmente. Ontem mesmo, com essa invenção dos cientistas de acabarem com o ponto G, a Elza Magna e o Teophanio Lambroso, os outros colaboradores, caíram fora. Elza, tendo chiliques por causa da notícia; e o Teopha, dizendo que ia até o supermercado tentar comprar um ponto H pra ela.

Amor e amor pra você, querida!